sábado, 23 de maio de 2009

Um Modelo para Nações Consumidoras de Drogas

Como nação consumidora, o Brasil emergiu como um laboratório de redução de danos superior ao dos Estados Unidos, em relação às drogas pesadas. Enquanto em algumas regiões valentes dos Estados Unidos, seringas limpas são distribuídas para os adictos (o mesmo acontece aqui, mas por meio do bom trabalho de uma organização diferente, sobre a qual falaremos nos próximos dias) – e, é claro, o altamente bem-sucedido movimento pelo uso da maconha para fins medicinais está em guerra com as forças de ocupação do governo federal em Washington DC -, os usuários e adictos de drogas pesadas no Norte não conseguiram até hoje se organizar de maneira a limitar efetivamente o campo de manobra que o Poder tem para reprimi-los e oprimi-los.
A auto-organização ao estilo brasileiro chegou.
A pedagogia da redução de danos no Brasil tem potencial para colocar o movimento pela reforma das políticas de drogas, internacionalmente, de ponta cabeça e alterar a política de drogas. Nos Estados Unidos, entre alguns ativistas pela legalização das drogas, existe uma tendência a subestimar as iniciativas de “redução de danos”, considerando-as muito desconjuntadas, muito “aceitáveis”, muito “light“, muito devagar… e pode ser que algo esteja faltando a esses esforços (embora a nossa tendência na Narco News tenha sido sempre “que mil flores floresçam e que a proibição de drogas sofra a morte das mil facadas”)… Mas deixe-me tentar, caro leitor, explicar a diferença…
Quando pensamos sobre as iniciativas tradicionais de “redução de danos” nos Estados Unidos, tendemos a pensar – às vezes corretamente, outras vezes não – em um ou uma assistente social ou “autoridade” médica oferecendo seringas limpas ou tratamento para adictos, em um ambiente característico dos “programas sociais”… Algo mais relacionado à caridade e ao fazer o bem – e à auto-perpetuação das burocracias e da “autoridade” médica ou psiquiátrica sobre a autonomia individual – do que à auto-organização e à concessão de poder…
Mas, no Brasil, é outra a vertente a partir da qual o poder está se formando: os usuários de drogas e adictos, como outros grupos marginalizados, tais como os já mencionados profissionais da indústria do sexo e os membros das famílias de presidiários, estão assumindo o controle da própria vida cotidiana, sem esperar que o governo ou outra autoridade lhes dê permissão. Eles avançam, e o Poder então tem de se adaptar às novas realidades que reivindicam, a partir das bases. As reformas governamentais são então respostas à auto-organização; elas não a precedem ou causam.
Isso é significativo por muitas boas razões, uma delas especialmente poderosa: na medida em que os usuários de drogas e os adictos se organizam localmente e se expandem, eles se politizam, aprendendo e ensinando as aptidões da democracia e como acionar estruturas governamentais e midiáticas, que anteriormente ou os ignorara ou reprimira, ou ambos. Esse movimento brasileiro de redução de danos tornou-se agora a tendência dominante em um movimento nacional de descriminalização das drogas consideradas ilícitas, antes liderado principalmente por pessoas que simples e justificadamente queriam ter o direito de fumar maconha em paz: mas esses setores há muito têm sido liderados pelas classes média e alta, como nos Estados Unidos.

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